sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O muro de carne.




Linda do Rosário:O muro da instalação da artista plastica Adriana Varejão.

Foucault e Pink Floyd?



segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Subversivo.

Aaron Swart  *Chicago, 8 de novembro de 1986  +Nova Iorque, 11 de janeiro de 2013

Não tenho nada para falar deste subversivo, não mais que a Jornalista Eliane Brum.


 – Eu sinto fortemente que não é suficiente simplesmente viver no mundo como ele é e fazer o que os adultos disseram que você deve fazer, ou o que a sociedade diz que você deve fazer. Eu acredito que você deve sempre estar se questionando. Eu levo muito a sério essa atitude científica de que tudo o que você aprende é provisório, tudo é aberto ao questionamento e à refutação. O mesmo se aplica à sociedade. Eu cresci e através de um lento processo percebi que o discurso de que nada pode ser mudado e que as coisas são naturalmente como são é falso. Elas não são naturais. As coisas podem ser mudadas. E mais importante: há coisas que são erradas e devem ser mudadas. Depois que percebi isso, não havia como voltar atrás. Eu não poderia me enganar e dizer: “Ok, agora vou trabalhar para uma empresa”. Depois que percebi que havia problemas fundamentais que eu poderia enfrentar, eu não podia mais esquecer disso.



Não tem mais o que falar...

A não ser: "Escutem aqui, vermes!!! Vocês não são especiais. Vocês não são um belo ou único floco de neve. Vocês são feitos da mesma matéria orgânica em decomposição como tudo no mundo." Clube da luta.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Homens Tubarões.


Foto: Alexander Safanov


Se Os Tubarões Fossem Homens

Bertold Brecht

Se os tubarões fossem homens, eles fariam construir resistentes caixas do mar, para os peixes pequenos com todos os tipos de alimentos dentro, tanto vegetais, quanto animais.

Eles cuidariam para que as caixas tivessem água sempre renovada e adotariam todas as providências sanitárias, cabíveis se por exemplo um peixinho ferisse a barbatana, imediatamente ele faria uma atadura a fim que não morressem antes do tempo.

Para que os peixinhos não ficassem tristonhos, eles dariam cá e lá uma festa aquática, pois os peixes alegres tem gosto melhor que os tristonhos.

Naturalmente também haveria escolas nas grandes caixas, nessas aulas os peixinhos aprenderiam como nadar para a guela dos tubarões.

Eles aprenderiam, por exemplo a usar a geografia, a fim de encontrar os grandes tubarões, deitados preguiçosamente por aí. aula principal seria naturalmente a formação moral dos peixinhos.

Eles seriam ensinados de que o ato mais grandioso e mais belo é o sacrifício alegre de um peixinho, e que todos eles deveriam acreditar nos tubarões, sobretudo quando esses dizem que velam pelo belo futuro dos peixinhos.

Se encucaria nos peixinhos que esse futuro só estaria garantido se aprendessem a obediência.

Antes de tudo os peixinhos deveriam guardar-se antes de qualquer inclinação baixa, materialista, egoísta e marxista e denunciaria imediatamente aos tubarões se qualquer deles manifestasse essas inclinações.

Se os tubarões fossem homens, eles naturalmente fariam guerra entre sí a fim de conquistar caixas de peixes e peixinhos estrangeiros.

As guerras seriam conduzidas pelos seus próprios peixinhos. Eles ensinariam os peixinhos que entre eles os peixinhos de outros tubarões existem gigantescas diferenças, eles anunciariam que os peixinhos são reconhecidamente mudos e calam nas mais diferentes línguas, sendo assim impossível que entendam um ao outro.

Cada peixinho que na guerra matasse alguns peixinhos inimigos da outra língua silenciosos, seria condecorado com uma pequena ordem das algas e receberia o título de herói.

Se os tubarões fossem homens, haveria entre eles naturalmente também uma arte, havia belos quadros, nos quais os dentes dos tubarões seriam pintados em vistosas cores e suas guelas seriam representadas como inocentes parques de recreio, nos quais se poderia brincar magnificamente.

Os teatros do fundo do mar mostrariam como os valorosos peixinhos nadam entusiasmados para as guelas dos tubarões.

A música seria tão bela, tão bela que os peixinhos sob seus acordes, a orquestra na frente entrariam em massa para as guelas dos tubarões sonhadores e possuídos pelos mais agradáveis pensamentos .

Também haveria uma religião ali.

Se os tubarões fossem homens, ela ensinaria essa religião e só na barriga dos tubarões é que começaria verdadeiramente a vida.

Ademais, se os tubarões fossem homens, também acabaria a igualdade que hoje existe entre os peixinhos, alguns deles obteriam cargos e seriam postos acima dos outros.

Os que fossem um pouquinho maiores poderiam inclusive comer os menores, isso só seria agradável aos tubarões pois eles mesmos obteriam assim mais constantemente maiores bocados para devorar e os peixinhos maiores que deteriam os cargos valeriam pela ordem entre os peixinhos para que estes chegassem a ser, professores, oficiais, engenheiro da construção de caixas e assim por diante.

Curto e grosso, só então haveria civilização no mar, se os tubarões fossem homens.



domingo, 6 de janeiro de 2013

A vida seria um barco bêbado.


Lunch on the Boat Artist: . 1898, Spain, Impressionism


O BARCO BÊBADO


(Arthur Rimbaud)

Como eu descia pelos rios impassíveis,
senti-me libertar de meus rebocadores.
Tomaram-nos por alvo os índios irascíveis
e pregaram-nos nus aos postes multicores.

Já não me preocupava a carga que eu trazia,
fosse o trigo flamengo ou o algodão inglês.
Quando dos homens se acabou a gritaria,
pelos rios voguei, liberto de uma vez.

Ante o irado ranger das marés, me lancei,
mais surdo que infantis cabeças, no outro inverno,
fugindo! E para trás penínsulas deixei
que jamais viram tão glorioso desgoverno.

A procela abençoou meu despertar marinho,
dancei como cortiça entre vagas e atóis,
que fazem vítimas no eterno redemoinho,
dez noites, sem pensar no olho vão dos faróis.

Doce como a maçã na boca de um menino,
meu lenho se encharcou do verde turbilhão,
que um caos de vômito e de vinho purpurino
lavou, e destroçou meu leme e meu arpão.

E mergulhei então no Poema do Mar,
todo de astros mesclado, e leitoso, a beber
os azuis verdes, onde, a flutuar e a sonhar
um absorto afogado às vezes vai descer;

onde, a tingir de um golpe o azul, à luz safira
dos dias, ritmos arrastados e delírios,
mais fortes que a embriaguez e mais vastos que a lira,
fermentarão do amor os amargos martírios.

Sei os céus a estalar de clarões, sei as trombas,
correntes e monções: e sei o anoitecer,
a exultante manhã qual um povo de pombas,
e vi por vezes o que o homem julgou ver.

Vi o sol-pôr manchado a místicos horrores,
iluminando longas urnas arroxeadas;
como dos mais antigos dramas os atores,
as ondas a rolar à distância, encrespadas.

Sonhei a noite verde entre neves radiosas
dar aos olhos do mar mil beijos hesitantes;
vi a circulação de seivas misteriosas
e o áureo-azul despertar dos fósforos cantantes.

Longos meses segui, tal como vacarias
histéricas, o ardor das ondas contra a areia;
sem suspeitar que os pés brilhantes das Marias
pudesse apaziguar o Oceano que se alteia.

Atingi, sabei vós, Flóridas escondidas,
os olhos da pantera ajuntando às floradas,
com pele humana. E tenso o arco-íris, como bridas,
no horizonte do mar, quais alegres manadas.

Vi fermentar pauis enormes e lameiros,
onde apodrece um Leviatã entre os juncais;
e entre bonanças desabar furiosos aguaceiros,
despencando o longínquo em golfos abismais!

Gelos, argênteos sóis, ondas, céus abrasantes!
Encalhes colossais nos mais fundos negrumes,
onde o piolho come as serpentes gigantes
que tombam da galhada entre negros perfumes.

Desejara mostrar às crianças as douradas
da onda azul, peixes de ouro, esses peixes cantantes
– a espuma toda em flor ninou minhas jornadas
e um inefável vento alou-me por instantes.

Das zonas e do pólo, às vezes, mártir exausto,
o mar, cujo soluço as fugas me adoçava,
dava-me flores de ouro e de sombrio fausto,
e eu, como uma mulher de joelhos, descansava.

Quase ilha, a balançar gritando às minhas bordas

rixas e estrumes de aves de olhos afogueados;
eu ia, enquanto pelas minhas tênues cordas
desciam, recuando, ao sono os afogados.

Eu, barco naufragado entre as marinhas tranças
pelos tufões aos ermos do éter arrojado,
cujo casco ébrio de água os veleiros das Hansas
e os Monitores não teriam resgatado;

livre, a fumar, envolto em brumas violetas,
que perfurava o céu vermelho como um muro,
que traz – confeitos deliciosos aos bons poetas –
liquens do sol e cusparadas do azul-escuro;

prancha louca, a correr entre uma escolta preta
de hipocampos, rajada a estrias resplendentes,
quando julho esboroava a golpes de marreta
do céu ultramarino os funis comburentes;

eu, que tremia, ouvindo a distante agonia
do cio dos Behemots e dos Maelstroms estreitos,
eterno tecelão da azul monotonia,
lamento a Europa dos antigos parapeitos!

Arquipélagos vi do firmamento! e as ilhas
onde em delírio os céus se abrem ao viajor,
é nessas noites que tu dormes e te exilas,
ó milhão de aves de ouro, ó futuro Vigor? –

Mas, não, chorei demais! Magoam-me as auroras.
Todo sol é dolente e amargo todo luar.
O acre amor me fartou de torpores, demoras.
Oh, que meu casco estale! Oh, que eu me lance ao mar!

Se desejo da Europa uma água, é a poça estreita,
negra e fria, onde à luz de uma tarde violeta
um menino agachado, entre tristezas, deita
seu barquinho, a oscilar como uma borboleta.

Imerso em languidez, não posso transcender
o rastro, ó vagas, dos que levam algodões,
nem dos pendões o orgulho e das velas vencer,
nem já nadar sob o olho horrível dos pontões.

(Tradução de Renato Suttana)


terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Um novo ano, feliz 2013.

Passagem do ano

O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.

Beijarás bocas, rasgarás papéis,
farás viagens e tantas celebrações
de aniversário, formatura, promoção, glória, [doce morte com sinfonia e coral],
que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,
os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.

O último dia do tempo
não é o último dia de tudo.
Fica sempre uma franja de vida
onde se sentam dois homens.
Um homem e seu contrário,
uma mulher e seu pé,
um corpo e sua memória,
um olho e seu brilho,
uma voz e seu eco,
e quem sabe até se Deus...

Recebe com simplicidade este presente do acaso.

Mereceste viver mais um ano.
Desejarias viver sempre e esgotar a borra dos séculos.

Teu pai morreu, teu avô também.
Em ti mesmo muita coisa já expirou, outras espreitam a morte,
mas estás vivo. Ainda uma vez estás vivo,
e de copo na mão
esperas amanhecer.

O recurso de se embriagar.
O recurso da dança e do grito,
o recurso da bola colorida,
o recurso de Kant e da poesia,
todos eles... e nenhum resolve.

Surge a manhã de um novo ano.
As coisas estão limpas, ordenadas.
O corpo gasto renova-se em espuma.

Todos os sentidos alerta funcionam.
A boca está comendo vida.
A boca está entupida de vida.
A vida escorre da boca,
lambuza as mãos, a calçada.

A vida é gorda, oleosa, mortal, sub-reptícia.



Carlos Drummond de Andrade